terça-feira, 7 de outubro de 2008

Contos Africanos

Os mitos são realmente , as histórias que curam. Isso porque nos são mais do que o desfecho moral que aprendemos associar, há muito tempo, às quadrinhas infantis e aos contos de fada. Lidos apropriadamente, os mitos nos deixam harmonizados com os eternos mistérios do ser,nos ajudam a lidar com as inevitáveis transições da vida e fornecem modelos para o nosso relacionamento com as sociedades em que vivemos e para o relacionamento dessas sociedades com o mundo que partilhamos com todasas formas de vida (FORD, Clyde W. O herói com o rosto africano. Mitos da África).

O objetivo deste texto é ressaltar a importância dos contos, orais e escritos, africanos e afro-brasileiros, destacando-os como marcas das experiências humanas de um povo ao longo dos tempos. São narrativas com rosto africano.

A história e a memória de vários povos africanos adentram e permanecem como parte de nossa cultura. Cultura essa materializada, em especial, na literatura oral expressa pelos mitos, lendas, provérbios, contos etc., ou, ainda, servindo como base da literatura escrita desta natureza.

No Brasil, uma das matrizes que informam a tradição oral diz respeito às influências dos africanos aqui escravizados que para cá vieram, guardiões e guardiãs responsáveis por recriar a memória dos fatos e feitos de seus antepassados, ressignificando a vida nos novos lugares de morada. Foram também poetas, músicos, dançarinos, estudiosos, mestres, conselheiros, denominados, de modo geral, como contadores de histórias.
Tal é a importância da palavra na África que existe um papel específico desempenhado pelos profissionais da tradição oral – os griots – pessoas que têm o ofício de guardar e ensinar a memória cultural na comunidade. Eles armazenam séculos e mais séculos de segredos, crenças, costumes, lendas e lições de vida, recorrendo à memorização. Existem também mulheres que exercem essas funções, conhecidas como griotes. Hampâté Bâ comenta sobre uma célebre cantora, Flateni, antiga griote do rei Aguibou Tall, cujos “cantos arrancavam lágrimas até dos mais empedernidos” (2003, p. 255). Há ainda outras categorias de contadores de histórias na África, como os Doma 3 , tidos como os mais nobres contadores, porque desempenham o papel de criar harmonia, de organizar o ambiente e as reuniões da comunidade. Eles jamais podem usar a mentira, pois isso faria com que perdessem sua energia vital, provocando um desequilíbrio no grupo ao qual pertencem ( Caderno de Educação – África Ilê Aiyê, 2001).

A tradição oral pode ser vista como uma cacimba de ensinamentos, saberes que veiculam e auxiliam homens e mulheres, crianças, adultos/as velhos/as a se integrarem no tempo e no espaço e nas tradições. Sem poder ser esquecida ou desconsiderada, a oralidade é uma forma encarnada de registro, tão complexa quanto a escrita, que se utiliza de gestos, da retórica, de improvisações, de canções épicas e líricas e de danças como modos de expressão.
Todos nós temos histórias para contar, imersos que estamos, ainda que por vezes sem perceber, no patrimônio cultural informado por mitos, lendas, provérbios, contos, canções, sátiras de todas as matrizes.

As narrativas orais expressam hábitos e valores cujo compartilhamento se dá no ambiente familiar, religioso, comunitário, escolar. Todo este patrimônio está no corpo e na mente das pessoas, onde quer que elas estejam.
As narrativas literárias são textos estéticos, lúdicos, que suscitam a criatividade, o imaginário da/o leitora/or. Nesse tipo de texto predominou uma referência a se seguir, em que as personagens brancas reinavam como padrão de representação literária e, por muito tempo, esse modelo ocidental eurocêntrico foi quase que exclusivo. Esse contexto vem sendo alterado pelas ações dos movimentos sociais negros, pelas influências de novas visões e concepções de educação, além dos dispositivos legais que atualmente orientam os currículos das escolas.

Há, atualmente, vários livros publicados que se propõem a desvendar o universo de algumas culturas africanas e da afro-brasileira. Só para citar alguns temos: Bichos da África , Volumes I, II, III e IV, Contos ao redor da fogueira e Histórias africanas para contar e recontar , de Rogério Barbosa; Que mundo Maravilhoso , de Julius Lester; Bruna e a galinha d'Angola , de Gercilga de Almeida; A cor da vida , de Semíramis Paterno; Tanto, Tanto , de Trish Cooke; Chica da Silva , de Lia Vieira e As tranças de Bintou, de Sylviane Diouf. Existem outros dentro do mercado editorial, o qual tem se interessado pelo tema, apresentando novas opções.

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